Prefeitos assumem incapacidade para acabar com lixões até 2014

Fim dos lixões vira um sonho distante – Prefeitos assumem incapacidade para acabar com depósitos a céu aberto até 2014, como manda a lei, e pedem mais prazo
“Meu pai e minha mãe me criaram com isso daqui, eu tirei o sustento dos meus filhos daqui, e, hoje, o do meu neto também. Se isso acabar, como é que nós vamos ficar?”, indaga Cosme de Assis, catador do Lixão da Estrutural, aqui no Distrito Federal, sobre a desativação do lugar. Cosme está incrédulo quanto às promessas de readequação dos catadores após o fim dos lixões, exigido pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), aprovada em 2010. O prazo para que todos os lixões a céu aberto do país sejam desativados vai até 2 de agosto do ano que vem. Mas, se depender de muitos prefeitos brasileiros, catadores como Cosme vão continuar vivendo no lixo por mais tempo. Matéria de Étore Medeiros e Marianna Rios, no Correio Braziliense, socializada peloClippingMP.
A Frente Nacional dos Prefeitos (FNP) anunciou que vai negociar com o Congresso e com o governo federal a prorrogação do prazo para que os municípios troquem os lixões por aterros sanitários ambientalmente corretos. Para o recém-empossado presidente da entidade, José Fortunati (PDT), de Porto Alegre, “é impossível que grande parte das cidades cumpra a lei”. Ele já buscou apoio dos presidentes da Câmara e do Senado para que seja alterada a lei que criou a PNRS. “Queremos prazos distintos de acordo com a realidade de cada cidade”, reivindica o prefeito. Ele argumenta que 72% dos prefeitos vitoriosos nas eleições de 2012 não estavam no cargo. Por isso, culpam as gestões anteriores pelo atraso na adaptação à lei.
O temor dos prefeitos tem procedência. O Ministérios Público poderá processar os prefeitos por improbidade administrativa, caso não desativem os lixões. Se isso ocorrer, todos poderão ficar inelegíveis. “Temos prefeituras no Acre, como a de Porto Walter ou de Santa Rosa do Purus, em que o prefeito não tem sequer um servidor de nível superior. Então, cada caso vai depender da postura e da sensibilidade do promotor e do gestor municipal”, diz a procuragora-geral do Acre, Patrícia de Amorim Rêgo.
Relator da lei que instituiu a PNRS, o deputado federal Arnaldo Jardim (PPS-SP) critica a proposta dos prefeitos. “A legislação tem que premiar posturas e punir quem não segue uma regra. Sou terminantemente contrário a qualquer dilatação do prazo”, afirma.

Novos prazos

O MMA estima que apenas 20% dos 5.565 municípios brasileiros concluíram os projetos ou solicitaram verbas para sua elaboração até 2 de agosto de 2012, quando expirou o prazo legal para esta etapa do processo.

O gerente de Projetos da Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano, Saburo Takahashi, revela que o órgão vai soltar, em breve, uma nova chamada para os municípios que perderam o primeiro prazo. “Para atender os 80% que restam, temos de tomar pé da situação e verificar como poderemos apoiar esses municípios que ainda não têm planos.”
Em Igaci, a 150 Km de Alagoas, o prefeito Oliveiro Pianco (PMDB) nem bem foi empossado e já recebeu uma intimação do Ministério Público para acabar com o lixão da cidade, de 25 mil habitantes, sob pena de pagar do próprio bolso multa de R$ 1 mil por dia. “Disseram que não podiam dar um prazo maior, pois tinham dado à gestão anterior”, reclama. A solução foi mandar os resíduos para o lixão da vizinha Palmeira dos Índios, a 15 km de distância. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontam que ainda há 2,9 mil lixões para serem erradicados em todo o Brasil, distribuídos em 2.810 municípios. A maioria, de pequeno porte, como Igaci, que, para se adequar à PNRS, se consorciou com Palmeira dos Índios e mais 11 municípíos do agreste alagoano para construir dois aterros sanitários de uso comum.
Para Maria Vitória Ferrari, pesquisadora em gestão e tecnologia de resíduos da Universidade de Brasília, “a questão é cultural, é a forma que convivemos com o lixo. Se os municípios tiverem mecanismos, as pessoas estão dispostas a fazer as coisas certas. Mas é preciso campanhas longas e contínuas de educação”, conclui a pesquisadora, ressaltando o papel individual no cuidado com os resíduos, mesmo após a implementação da PNRS.

Lixões no Brasil (por região)

                     Municípios                   Municípios com lixões
Brasil                    5.565                     2.810    (50,5%)
Nordeste               1.794                     1.598    (89,1%)
Norte                      449                        380    (84,6%)
Centro-Oeste           466                        339    (72,7%)
Sudeste                 1.668                       311    (18,4%)
Sul                         1.188                     182    (15,3%)
Fonte: Ipea
Aterro do DF sub judice
Enquanto a Novacap licita as obras de infraestrutura para o futuro Aterro Sanitário de Samambaia, o certame para contratar os serviços de impermeabilização do local e a empresa que vai operar o depósito foi suspenso em fevereiro pelo Tribunal de Contas do DF. “Já respondemos aos questionamentos, mas o tribunal não se manifestou. Estamos de mãos atadas, infelizmente, em função dessa paralisação. O fim do Lixão da Estrutural depende da entrada em operação do aterro de Samambaia”, lamenta o diretor da assessoria de Planejamento e Projetos Especiais da Secretaria de Limpeza Urbana (SLU), Edmundo Gadelha. Ele estima em seis meses o tempo necessário para que o aterro sanitário entre em operação, após a liberação judicial.

“A legislação tem que premiar posturas e punir quem não segue uma regra. Sou terminantemente contrário a qualquer dilatação do prazo”
Arnaldo Jardim (PPS-SP), deputado federal e relator da Política Nacional de Resíduos Sólidos

O que diz a lei
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) passou duas décadas em tramitação no Congresso até virar lei em 2010. Um dos principais objetivos é fazer com que o Brasil atinja o índice de reciclagem de resíduos de 20% até 2015, que é uma das metas do Plano Nacional sobre Mudança do Clima. A política do lixo tem horizonte de 20 anos e será atualizada a cada quatro anos. Uma das principais novidades da PNRS é a logística reversa, que determina a responsabilidade compartilhada entre fabricantes, fornecedores, comerciantes e consumidores de produtos para garantir que os resíduos sejam descartados de forma ambientalmente correta. A lei também institui programas de coleta seletiva, educação ambiental e inclusão dos catadores de material reciclável em todos os municípios. Também exige padrões sustentáveis de produção e de consumo, e reciclagem de resíduos. O ponto mais polêmico é, sem dúvidas, a exigência para que estados e municípios desativem todos os lixões e instalem aterros sanitários até 2 de agosto de 2014. A lei admite que os municípios formem consórcios para a gestão dos resíduos sólidos. Segundo o texto, o prefeito que não cumprir o prazo pode ser processado por improbidade administrativa. As cidades tiveram dois anos para se adequar à política nacional, mas a maioria sequer elaborou o Plano Municipal de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos, que é a primeira etapa do processo.

EcoDebate, 06/05/2013


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